POR HERNÁN PANESSI & WAGNER BORDIN
No pescoço, medalhas de três campeonatos brasileiros de remo (júnior, sub-23 e sênior) e, no corpo, uma linha de remédios que o ajudam a tratar seus tiques e tocs. É que, desde cedo, o atleta brasileiro Tomás Levy foi diagnosticado com Síndrome de Tourette, um distúrbio do sistema nervoso caracterizado por movimentos repetitivos ou sons não intencionais.
“Não quero tomar remédio a vida inteira”, resmunga Levy, visivelmente chateado. “A certa altura, abri a cabeça e quis experimentar outras alternativas, entender o que era a cannabis”, diz o multicampeão exclusivamente para El Planteo e Weederia.
No entanto, no início, sua mãe resistiu: ela tinha seus preconceitos. Mas vendo os efeitos colaterais de seus medicamentos, eles decidiram experimentar a cannabis também. “Agora ela me apoia e, nesse período, viu todas as minhas melhorias”, explica. “A cannabis é um dos medicamentos que mais me fez efeito”, confessa o jovem de 20 anos.
Esporte de elite e CBD
Foi assim que, em 2015, em plena puberdade, quando seus hormônios estavam fervendo e a síndrome de Tourette estava no auge, ele viajou para o Rio de Janeiro e conheceu a APEPI, associação que tem regulamentação legal provisória para o cultivo e produção de óleo de cannabis.
“Peguei aquele óleo e comecei a entrar no movimento. Para estudá-lo mais. Descobri que o CBD me ajudou muito com a síndrome de Tourette e tenho tomado isso desde então”, diz Tom.
Desde as Olimpíadas de Tóquio de 2021, a Agência Mundial Antidoping (WADA) reconhece o CBD para esportes de elite e foi removido das substâncias proibidas.
“Sofro muito com os preconceitos que existem com o mundo da cannabis. Tenho minhas responsabilidades como atleta e minha saúde também está presente”, diz.
E continua: “Não é fácil falar sobre cannabis medicinal, nem é fácil para mim falar sobre meu tratamento. Eu tenho que tomar CBD para minha síndrome e não é que isso me dê melhor desempenho, apenas ajuda minha saúde.”
— O CBD ajuda você com foco?
— Às vezes a Tourette tira seu foco e com o CBD eu consigo focar. O remo é um esporte muito focado e também me ajuda.
Você viaja com óleo?
—Sim, viajo com meu CBD.
Uma relação madura com o remo
Ao longo de sua vida, Tom praticou vários esportes. “Minha mãe sempre me mandava fazer esportes para gastar energia porque sempre fui uma criança muito agitada”, brinca.
Assim, ele fez boxe (“Minha mãe não gostava que eu levasse pancadas na cara”), esgrima (“Muito bom para concentração”) e depois veio o remo (“Consigo me concentrar”). Além disso, ele toca piano e, nesse nível de concentração, é quando tem menos tiques.
Mas há cerca de cinco anos o remo se tornou seu principal esporte e ele se tornou um atleta profissional. “No começo tive maus resultados. Cansava e parava. Estou agora em um relacionamento mais maduro com o remo. Comecei a ganhar, a ter melhores resultados. Sempre tive altura, bons braços e uma certa qualidade, mas comecei a treinar mais e melhorar.”
Tom já participou de sul-americanos, também de Copas do Mundo e chegou a subir ao pódio. E, em breve, provavelmente viajará para a Copa do Mundo na Suíça e seu próximo objetivo é chegar aos Jogos Olímpicos de Paris em 2024.
O caminho do CBD: um processo
Hoje em dia, a cannabis se tornou um benefício físico (“sou muito estável”) e ele espera, em algum momento, deixar de ser sertralina e aripiprazol, dois dos medicamentos que toma diariamente. “O CBD não tem efeitos colaterais para mim. Não possui produtos químicos. Meu corpo está acostumado com Sertralina e Aripiprazol. Quando fico dois dias sem beber, sinto uma sensação estranha”.
“Como uma abstinência?”
— Sim, infelizmente sim, somos prisioneiros disso. Somos viciados em drogas. Com Tourette eu tinha tudo: tiques, tocs, ataques de pânico. Tudo. Na época em que tive ataques de pânico, comecei a tomar qualquer remédio e tive experiências horríveis. Eram medicamentos muito errados, andava como um zumbi. Estou melhor hoje. É um processo. Eu não estou pronto para sair dos remédios ainda. Em algum momento, vou tentar ficar apenas com a cannabis. Vamos ver como acontece. E se piorar, volto aos remédios. E se eu melhorar, vou ficar com cannabis.
— O óleo CBD que você toma atualmente da APEPI?
— Não, é do USA Hemp, um dos meus patrocinadores. É uma empresa norte-americana formada por brasileiros. Eles são patrocinadores de muitos atletas. É um produto importado, por isso é caro. Antes, minha família me ajudava a conseguir.
Os preconceitos do sistema
E apesar de ser um atleta profissional de destaque e ser endossado pelos regulamentos oficiais, Tom ainda sofre com o preconceito do sistema por conta da “cannabis”. Ele se sente pressionado, ainda fica desconfortável toda vez que fala sobre isso. “Gostaria de falar sobre tudo o que penso, mas ainda há algo como um tabu. E não deveria. Eu me sinto arriscado e não quero ou ser condenado pelo meu remédio”, aposta.
“E por que você decidiu falar?”
— Porque acompanho o movimento há muitos anos. Era natural para mim fazê-lo. Todos têm que ser quem são. A mudança de cabeça está chegando. Com o tempo isso vai mudar. Mas hoje, infelizmente, muitos de nós ainda estão sofrendo.