Thomas B. Kin Chong é um chino-canadense de 83 anos de idade, nascido Calgary, Canadá, que não terminou os estudos, pois teve de trabalhar para sobreviver e que, no caminho da vida, encontrou um parceiro chamado Richard Anthony Marin e tomou o mundo como uma tempestade com Cheech e Chong.

Tommy Chong é muito mais do que estas breves linhas que o descreve. Aliás, como ele mesmo se descreve. É um ícone, responsável por, ainda na década de 70, falar abertamente sobre maconha nos Estados Unidos, fazer filmes e muito sucesso no mundo com isso. Suas obras moldaram gerações e ainda continuam a moldar. Basta ir a algum bloco carnavalesco que você irá se deparar com alguém vestido de Chong e um baseado gigantesco em mãos.

A maconha, por sua vez, acompanhou toda a trajetória de Tommy. É sua companheira desde os 17 anos, esteve ao seu lado quando era um músico da famosa banda canadense Bob Taylor and the Vancouvers, ganhou o mundo em seus filmes, foi sua cura quando teve câncer e é com ela, aos 83 anos de idade, que ainda pretende realizar muitos sonhos doces. Segundo confessa, a cannabis é a sua conexão com Deus.

“A cannabis é, realmente, uma salvadora de vidas, de muitas formas. Me salvou. Me ajudou quando eu era um músico tocando na Montown, me ajudou quando eu e Cheech começamos a gravar, porque a maconha é como se fosse a minha conexão com Deus. É a fumaça santa, é o arbusto em chamas que Moisés fala”, conta Chong em um bate papo que tivemos com ele.

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Incansável, ainda carrega consigo uma missão: mostrar ao mundo quão saudável a maconha, que é tão estigmatizada, pode ser.

“Ela me ajudou a lutar contra o câncer, eu tive câncer duas vezes e ela me ajudou a ficar curado. Eu tenho toda uma história com a maconha, eu tenho que mostrar ao mundo quão saudável é. Quando eu tinha 17 anos de idade estava em um programa muito rígido para comer certo, dormir bem e viver melhor ainda. Sem beber e fumar cigarros. Mas, tinha uma coisa que eu não conseguia ficar sem: era a cannabis. Ao invés do álcool, eu tinha a maconha, ao invés dos remédios que não são bons para você, eu tinha a maconha. Ela é realmente a minha salvadora”, confessa Tommy.

Diana Ross, música e comédia em um clube de striptease 

O encontro de Chong com o estrelato se deu muito antes de pisar em Hollywood. Ainda no Canadá, fez parte da banda ‘Bobby Taylor & the Vancouvers’, que foi descoberta por Diana Ross. Ela foi a responsável pela banda assinar com a famosa gravadora Motown. Chong foi o autor de um dos maiores sucessos da banda, ainda em 1968:  “Does Your Mama Know About Me”, que alcançou a 29ª posição nas paradas pop. 

Diana Ross não foi a única estrela nesta carreira de Tommy. Em seu livro, Cheech & Chong: The Unauthorized Biography, Chong relembra do dia em que conheceu o Jackson 5 em Chicago, quando eles ainda nem tinham assinado com a Motown.

“Os Jackson 5 roubaram o show no minuto em que subiram ao palco… Bobby imediatamente convidou os meninos e seu pai Joe para Detroit, prometendo-lhes que os assinaria para a Motown… Eu sei alguns detalhes porque Joe Jackson me trouxe o contrato para cuidar dele. Eu disse a ele que eles receberiam uma boa educação da Motown e depois de sete anos (a duração do contrato), eles estariam prontos para qualquer coisa. Joe me agradeceu por minha opinião sobre a situação, e seus meninos começaram a entrar no estrelato.”

Mas, sua carreira como músico desta banda não durou muito. Tommy foi despedido e voltou para o Canadá. Artista por essência, logo começou a atrair o público para os seus shows. No entanto, estes não eram de música. Eram apresentações de comédia com striptease.

“Eu fui demitido da Motown e voltei para casa, trabalhei em alguns bares e, talvez, eu até começasse a tocar com uma outra banda. Eu estava fazendo as luzes de dois bares, entre eles um stripclub, e estudando muito sobre teatro de improvisação à época. Quando eu vi o strip show , eu pensei, ‘uooow, isso pode dar um belo show de improvisação’. Não havia sexualidade envolvida, então eu pensei que poderíamos ter num strip club alguns show de improvisação”, conta Tommy.

De diretor e criador, rapidamente Tommy passou a ser ator, e um novo mundo se abriu.

“Nós começamos a fazer comédia e tínhamos muitos atores envolvidos. Mas, num dia um deles saiu e eu tive de ir atrás de outro. Então, perguntei a um amigo se ele faria o show. Ele disse: ‘eu faço se você fizer’. O próximo passo foi estar no palco, dirigindo e fazendo shows. Eu me diverti muito, assim que eu subi no palco tudo ficou tão normal”.  

Nasce a dupla de maconheiros mais icônica do mundo

Ricahrd Antony Marin, mais conhecido como Cheech, é um norte-americano descendente de mexicanos que cresceu no subúrbio de Los Angeles. Em 1968, a cerâmica e a Guerra do Vietnã o levou para o Canadá.

Em um protesto contra a guerra, Marin rasgou seu cartão de alistamento. Como forma de retaliação, um general norte-americano pediu que os indivíduos que tivessem vandalizado o seu cartão deveriam ser reclassificados como aptos para o serviço militar. 

Sem a menor intenção de ir para o Vietnã, Cheech foi parar no Canadá e trabalhou no estúdio de um oleiro nas montanhas de Alberta. Através do editor de uma revista, para a qual Marin escrevia ocasionalmente, ele conheceu Tommy Chong. E, depois deste encontro, as coisas nunca mais foram as mesmas. A química surgiu e os dois começaram a trabalhar juntos no Canadá.

“Nós estávamos perdendo dinheiro no stripclub, porque você não consegue fazer dinheiro com o teatro, é impossível. Foi quando fomos demitidos e o grupo se desfez. Então, eu e Cheech nos reunimos e começamos uma banda. Ele era o cantor e eu o guitarrista. Mas, nunca tocamos uma nota. Na primeira noite fizemos um pouco de comédia, depois um pouco mais de comédia…”, relembra Tommy.

Mas, eles ainda não eram Cheech e Chong. Até que uma noite chuvosa resolveu isso.

“Não tínhamos um nome. Quando, um dia, estávamos voltando pra casa, na chuva, descobri que o apelido dele era Cheech. Então, Cheech e Chong nasceu naquela noite. E tem sido lindo desde então”.


Do Canadá, partiram para Los Angeles, começaram em clubes de comédia e logo estavam gravando o primeiro disco, de comédia. Em 1974 ganharam um Grammy Award pelo álbum de comédia “Los Cochinos.” Cheech e Chong conquistaram a América, antes mesmo dos filmes, com sua comédia. Mas, este sucesso não foi surpresa para Tommy.

“Eu já era velho o suficiente. Havia passado por toda esta fase com a banda. Meu primeiro triunfo foi com os nightclubs. Esta foi a primeira vez que eu não tive de me preocupar com a palavra aluguel. Por isso eu soube logo de cara, quando eu e Cheech atuamos juntos, que tinha algo de especial ali”.

Em 1978 lançaram “Up in Smoke”, o filme teve uma das 20 maiores bilheterias do ano – que os transformou em ícones da comédia. Mais do que comédia, os filmes de Cheech e Chong ajudaram a derrubar mitos ligados à maconha e aos mexicanos. Vale lembrar que vivia-se o auge da propaganda proibicionista nos Estados Unidos, com forte preconceito aos latinos.

“Cheech, com seu personagem, mostrou o real mexicano, o real latino, a pessoa real. Ele não é aquele cara com a arma na mão, querendo atirar em todo mundo querendo começar um cartel. Ele é o cara que quer dirigir o seu lowrider, cantar e fumar maconha. Só isso”.

É difícil desassociar a imagem de Tommy Chong da maconha nos dias atuais. Nas décadas de 70 e 80, era mais difícil ainda. E, nem mesmo com toda propaganda do governo norte-americano contrária às drogas, o ator teve medo. Ele e Cheech foram presos apenas uma vez, mas por obscenidade (enquanto dupla). Anos depois Tommy foi preso por vender parafernália online, em uma ação um tanto quanto estranha da polícia, e teve de ficar preso por um tempo).

“Eu não tinha medo. A polícia não queria prender ninguém por conta de maconha. Eles só prendiam por conta do racismo, é uma lei racista. É por isso que eles chamam de ‘marijuana, dirty cannabis’, isso soa tão ‘irc, tão mexicano: Eles fumam marijuana’. Mas, nós nunca tivemos medo, nunca. Fomos presos por obscenidade, nunca fomos presos por maconha. Por vezes, quando passávamos a fronteira com maconha, o policial olhava pra gente e falava: ‘Bom, vocês são Cheech e Chong, sem problemas’.”

De fato, Tommy conta que uma das suas grandes inspirações, o ator e comediante Leny Bruce, já havia pavimentado o caminho da comédia sobre drogas.

“Ele era realmente inovador. Ele falava sobre maconha, drogas. Foi a primeira vez que um comediante fez isso. Ele afetou minha comédia. Leny foi o primeiro a fazer humor sobre drogas e, depois, todo mundo copiou Leny. Todo mundo. Ele abriu a porta e nós passamos”, relembra.

Mas, a relação com a polícia nem sempre foi de muito amor. Tommy relembra que no Canadá ele era muito incomodado pelos policiais nas portas dos bares enquanto fumava um baseado. Tanto que um policial foi homenageado em seu filme ‘Nice Dreams’.

“Nós sempre tivemos alguma coisa com a lei. A razão pela qual nós saímos do Canadá foi porque eles queriam nos prender sempre. Você sabe, éramos músicos, vivíamos nos clubes, fumavamos, muitas vezes até com os clientes. E os policias, você sabe, sempre queriam nos pegar. E foi por isso que no filme eu chamei um dos policiais pelo real: Stedenko. Stedenko era um dos policiais. Então, eu o coloquei num dos nossos filmes e o fiz famoso. Eu tive minha revanche”, conta Tommy, com a alegria de uma criança que acaba de pregar uma peça.

No filme, Stedenko é o sargento que fica com a maconha apreendida de Cheech e Chong. Ele resolveu experimentá-la e, à medida que fumou a erva, foise transformando num lagarto. Será que veio daí a ideia do presidente da república do Brasil de que vacinados poderiam virar jacaré?, perguntamos à Tommy.

“Acho que aquele filme influenciou um monte de malucos”, brinca, aos risos, Tommy.


Ideias para um futuro melhor

Da década de 80 até hoje, muita coisa mudou. Cheech e Chong se separaram, Tommy foi preso, teve câncer, se curou com a ajuda da maconha, a cannabis passou a ser legal em diversos estados dos Estados Unidos e no Canadá. Mas, teve uma coisa que não mudou, sua relação com a erva.

Hoje, Tommy é empresário no ramo da cannabis. Possui uma linha de produtos com seu nome, planeja abrir dispensários pelos Estados Unidos, participa (até o início da pandemia) de eventos com os seus fãs nos quais até fuma um com eles e ainda sonha em ajudar a humanidade mais ainda.

“Eu estou tentando tornar a maconha mais acessível, legal para todos, eu quero ajudar a humanidade. Eu tenho algumas boas soluções para os problemas dos moradores de rua, para a saúde e bem-estar. E a forma com a qual eu quero fazer isso é através dos filmes, porque um filme pode criar não apenas sonhos, pode criar a realidade”, diz, com brilho nos olhos, Tommy.

E sabemos bem como ela pode mudar a realidade. Sua arte reflete até os dias atuais na sociedade. No Brasil, temos inúmeros fãs que se inspiram em Cheech e Chong e sua luta para continuar lutando pela legalização da maconha, seja ela de uso medicinal ou adulto.  

E, por falar em Brasil, Tommy demonstra-se um apaixonado pelas belezas do nosso país e por nosso povo.

“Vocês são uma das pessoas mais maravilhosas do mundo”, conta o ator.

E, de olho no que acontece no Brasil, Tommy, que é declaradamente anti-Trump, declara:

“Você viu o que aconteceu com Trump? É isso que vai acontecer com o seu cara”.

E deixa um última mensagem:

“Então, você tem que manter a fé. Saiba no seu coração o que seu país realmente é, quão belo é o seu país”.

Foto:Randy Miramontez / Shutterstock.com