A Síndrome de Tourette é um transtorno do neurodesenvolvimento que se caracteriza pela presença de tiques motores e vocais, sendo também frequentemente associada a outros distúrbios neuropsiquiátricos, como ansiedade, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).

Nas últimas semanas, muito tem se falado da relação entre a cannabis e o tratamento da doença. Isso porque o lutador de jiu-jitsu Antonio Carlos Júnior, vulgo Cara de Sapato, participante da atual edição do programa Big Brother Brasil, revelou não somente que sofre com Síndrome de Tourette e crises de ansiedade, como também afirmou que faz uso do CBD (canabidiol) para controle dos sintomas da doença. Ele também explicou que não utiliza o THC (tetrahidrocanabinol), a substância psicoativa da cannabis. Mas, afinal, quais são as diferenças entre CBD e THC? E de que forma a cannabis pode auxiliar pessoas diagnosticadas com Síndrome de Tourette?

CBD X THC

Inicialmente, é importante dizer que a presença de THC não define se um produto é danoso ou não. O médico Pietro Vanni, psiquiatra e especialista em cannabis medicinal, diretor médico da Clínica Gravital, afirma que tanto o CBD quanto o THC são fitocanabinoides presentes na cannabis, sendo que ambos possuem potenciais terapêuticos.

“A definição do melhor tratamento deve ser feita sempre por um médico prescritor, mas os dois compostos possuem indicações médicas, que variam de acordo com a patologia”, afirma o médico. Por exemplo, em pacientes com quadros de dores neuropáticas, é comum utilizar produtos com THC, que apresentam ótima resposta ao tratamento. Já em casos de epilepsia, é utilizado produtos que contenham quantidade expressiva de canabidiol. 

Já na Síndrome de Tourette, estudos citam evidências de que tanto o CBD quanto o delta-9-tetra-hidrocanabinol (Δ 9 – THC), principal elemento psicoativo na planta, podem ser eficazes no tratamento dos problemas comportamentais e tiques ocasionados pela doença. “Utilizamos o THC tanto no tratamento dos tiques, quanto nos problemas comportamentais que podem acompanhar a síndrome. Muitos pacientes também têm bons resultados com o CBD, já que ele diminui a ansiedade. Dessa forma, ao reduzir a ansiedade, indiretamente você acaba também melhorando os tiques”, explica o psiquiatra. 

A eficácia da terapia com cannabis

A cannabis se mostra eficaz no tratamento porque atua no sistema endocanabinoide, que é um sistema único de comunicação encontrado no cérebro e no corpo que afeta muitas funções importantes. Ele possui dois tipos de receptores: o CB1 e o CB2. Enquanto o primeiro é mais encontrado no sistema nervoso central, sendo responsável por modular comandos a regiões cerebrais, o segundo está espalhado por outras regiões do corpo e tem efeito no sistema imunológico, órgãos, ossos e células adiposas. “Quando o óleo de cannabis é ingerido, os canabinoides ativam o sistema endocanabinoide, promovendo melhoria em uma série de enfermidades, como é o caso da Síndrome de Tourette. Como o comando central dos tiques é o sistema nervoso, a cannabis atua positivamente na raiz do problema”, diz Pietro.

Outra grande vantagem no tratamento com cannabis diz respeito aos efeitos colaterais. Isso porque, nos tratamentos convencionais, que incluem antipsicótico, esses efeitos são bastante significativos e oferecem alívio apenas parcial dos sintomas. Já no caso da cannabis medicinal, os efeitos colaterais são poucos e controlados. “Eles fazem parte das propriedades psicoativas do composto, e acontecem tanto no uso medicinal, como recreativo, pois tudo depende da quantidade de canabinoides. Entretanto, no uso medicinal o médico especialista avalia caso a caso, de forma a prescrever quantidades seguras, acompanhar todas as etapas do tratamento e assim amenizar os possíveis efeitos colaterais”, afirma o médico.